O domínio social do homem branco estabeleceu a imagem de Deus como sendo a sua.
Por Cassiana Matos de Moura*
A cada ano as mulheres vêm ganhando espaço em nossa sociedade, isto graças à luta do movimento de emancipação e igualdade entre os gêneros, o feminismo. O movimento feminista data dos anos 1890, embora haja traços de suas reflexões desde os anos 1700. Dividido em quatro grandes ondas, o feminismo sempre encontrou como notável empecilho o universo religioso. A estrutura religiosa preponderante, a cultura judaico-cristã, sempre agiu como uma inimiga eminente do movimento de emancipação da mulher e pela luta pela igualdade de gêneros, sobretudo a Igreja Católica, que definia as mulheres como o “vaso mais frágil”.
Leia também:
É fundamental entendermos, através de uma análise mais crítica, que a construção do imaginário religioso monoteísta patriarcal se dá pela dominação dos homens na sociedade. As religiões ditas como pagãs possuíam um universo de possibilidade de relações com o sagrado não estritamente masculinizado. Isto fica claro quando nos atemos às religiões de matriz africanas, indígenas e pagãs. O universo sagrado politeísta enxerga o feminino como o que há de mais sagrado no universo, pois o feminino, a mulher, gera a vida, e mais sagrado é a vida.
A difusão histórica mais forte dos conceitos religiosos patriarcais, apresenta uma outra particularidade, a propagação do imaginário cristão que temos hoje, além de masculinizada, é branca, o que não só exclui as mulheres em si, mas as mulheres negras tornam-se duplamente excluídas.
Mas, e se pensarmos a ideia de Deus como imagem e semelhança de sua criação? Chegaremos a uma reflexão entendida pela cultura patriarcal caucasiana dita como herética. Se Deus é minha imagem e semelhança, logo, Deus é uma mulher preta!
Essa reflexão só é possível sob uma perspectiva judaico-cristã a partir das discussões promovidas pelo feminismo. Entender-nos como não objetos, ou como não sendo o “vaso mais frágil” e sim como imagem e semelhança de Deus é fundamental para questionarmos os papeis impostos pela sociedade.
Na interpretação das escrituras sagradas, que é relevante ressaltar, em geral escritas por homens, nos dá uma infinidade possibilidades de interpretações e reformulações no que diz respeito a nossa relação com o sagrado. A partir do momento em que entendemos no sentido mais amplo que somos a imagem e semelhança de Deus, a relação com o sagrado se torna mais acolhedora e terna.
Deus pode ser mulher, Deus é mãe. Afinal, não há uma prova concreta do que realmente seja Deus, pois é o que nos transcende, é metafísico.
Ao interpretarmos Deus como feminino damos poder às mulheres, o que na estrutura patriarcal não é visto com bons olhos. Daí, caçar bruxas, tratar-nos como heréticas e impuras. Afinal, mulheres empoderadas mudam o mundo. Mas imagine você, mulheres pretas e empoderadas, entendendo-se como imagem e semelhança do próprio Deus!
*Cassiana Matos de Moura é mestra em Ciências da Religião, graduada em Pedagogia e professora de Ensino Religioso.
Você quer receber notícias do domtotal em seu e-mail ou WhatsApp?
DomTotal é mantido pela EMGE - Escola de Engenharia e Dom Helder - Escola de Direito.
Engenharia Cívil, Ciência da Computação, Direito (Graduação, Mestrado e Doutorado).